Durante anos escutei, de muitos companheiros de fé e caminhada, a seguinte máxima: “Odeio o pecado, mas, amo o pecador”. E o engraçado é que sempre escutei isso com grande naturalidade e confesso que até com muita simpatia.

Nas entrelinhas dessa afirmação, meus colegas estariam dizendo algo que até pouco tempo (confesso) achava correto e por que não justo: odeio o roubo, mas amo o ladrão; odeio a mentira, mas amo o mentiroso; odeio a hipocrisia, mas amo o hipócrita; chegando inclusive ao absurdo de dizerem odeio o homossexualismo, mas amo o homossexual, tendo por igual valor a homossexualidade com o ato de roubar, mentir, e tantas outras ações depreciativas.

Por sinal, esse último argumento tem servido de fundamento para que muitos demonstrem seu desamor, desrespeito e des-graça (repletos de hostilidade) para os que escolheram manter uma relação homo afetiva, ou os que mesmo sendo hetero, lutam pelos direitos dos homossexuais. Contudo, o maior agravante desse tipo de pensamento está no fato desse reduzir a questão da homo afetividade a mero problema comportamental, o que considero inadmissível em nossos dias.

Dissimulando um ar de piedade, os que se escondem atras desse tipo de argumento mostram-me cada vez mais na prática, o que Ricardo Quadros Gouveia chamou de “piedade pervertida”. Contudo, isso é um outro assunto, que inclusive, já discorri em outro texto (TODA FORMA DE AMOR VALE A PENA…).

A minha grande questão com esse escrito é: podemos separar as pessoas de seus atos? Não serão nosso atos – palavras e ações – que dizem muita coisa do que somos? Claro que somos muito mais daquilo que fazemos e do que deixamos de fazer (esse último pode dizer muito mais coisa do que o primeiro), mas, também não podemos negar que nossas ações norteiam quem de fato somos.

E como ninguém é formado somente de virtudes, aquilo que julgamos ser mal também é peça importante, matéria-prima de quem nos tornamos diariamente. Como já dizia meu amigo Ricardo Gondim (e tantos outros antes dele) somos “luzes e sombras”.

Sendo assim, quem se propõe a me amar, tem que estar disposto a abraçar a integralidade do meu ser, minhas luzes e sombras, virtudes e pecados, graças e desgraças. Pois é isso o que de fato sou. Tudo junto e misturado.

Não seria essa a grande Boa Nova do Pai para a humanidade: “Venha como estás!” Deus te ama e te recebe do jeito que você é, sem que seja preciso fazer mais nada. Alguém pode até chamar isso de “graça barata”, mas eu prefiro a definição de Brennan Manning, “graça gratuita”, e ela se basta. É suficiente.

Por acaso, não seria isso que o apóstolo Paulo quis nos ensinar quando disse: “Onde abundou o pecado, superabundou a graça”? Ou seja, o outro não deve ser medido pelo tanto de “mal” que você enxerga nele, e sim pela graça e perdão que outrora inundou a sua vida (…aquilo que de graça recebi, de graça dou…).

Como então separar pessoa e ação? Não seria como separa “alma e espírito, juntas e medulas”? Será que na tentativa de fazer isso não incorremos no risco de amar uma farsa, ou melhor, uma pessoa de mentira, que só existe na fantasia hipócrita de um mundo ideal, repleto de pessoas idealizadas?

Na minha inquietação, prefiro o caminho de aceitar as luzes e sombras que existem em mim e amar os outros que à minha semelhança, estão longe da perfeição, mas aceitam o desafio diário de se tornarem pessoas melhores, a ter que escolher o caminho que nos leva a construir ídolos para amar e conviver.

Quero ser alguma coisa a cada minuto de cada hora da minha vida. Quero ser alegre; quero ser triste; indiferente, e depois acolhedora. Sentir fome (…) e ter muito o que comer. Quero andar em andrajos, ou muito bem vestida. Quero ser sincera e insincera. Quero falar a verdade, e depois mentir. Quero ser irrepreensível, e também pecadora. Quero apenas ser alguma coisa a cada minuto bendito. Ao dormir, quero sonhar o tempo todo, para que nenhum pedacinho de vida se perca. (Betty Smith, em Uma árvore floresce no Brooklyn)